“Entre Facas e Segredos” | Crítica
Filmes do gênero ‘murder mistery‘ sempre estiveram na moda! Afinal, nós brasileiros estamos acostumados a ver isso em toda novela das 21h. Da nova versão de “Assassinato no Expresso Oriente“ (2017), visitando o “Mistério no Mediterrâneo” (2019) e as sequentes adaptações de Sherlock Holmes, fato é que sempre adoramos esse tipo de roteiro e as salas de cinema sempre recebem mais um belo exemplar.
“Entre Facas e Segredos“, embora não tenha sido baseado em nenhum livro da autora em especial, é inspirado nas tramas instigantes de Agatha Christie. O diretor Rian Johnson (“Star Wars: Os Último Jedi“) faz uma homenagem a clássicos como “O Fim de Sheila“ (1973), “Os Sete Suspeitos“ (1985) e “Assassinato em Gosford Park“ (2001).
O enredo mostra um famoso e bilionário escritor de livros, Harlan Thrombey (Christopher Plummer), que, próximo de anunciar quem serão os herdeiros de sua fortuna, reúne seus parentes para sua festa de 85 anos. No dia seguinte a data, ele é encontrado morto. E aí começa a brincadeira para adivinhar de quem seria a culpa do crime.
Embora grande parte da história aconteça em um casarão tradicional de época, vemos celulares e computadores, além de atores com apelo para uma audiência mais jovem.
O grande mérito do diretor é manipular a narrativa clássica com uma linguagem mais moderna, incluindo fotografia, transição e filtros modernos. É nítido enxergar isso em personagens interpretados pelos atores mais jovens, como Jaeden Lieberher (“It: A Coisa“), que faz o neto de Harlan, sempre no celular, postando coisas sobre a extrema direita em redes sociais; Katherine Langford (“13 Reasons Why“), a neta que é uma artistas ativista liberal com ímpetos de ‘social justice warrior‘; e Lakeith Stanfield (“Atlanta“), um dos policiais destacados para investigar a morte de Harlan.
É inevitável não falar sobre os atores, escolhidos a dedo para a narrativa desenvolvida pelo diretor. Ele fez questão de escolher rostos famosos, que trazem muita bagagem de seus personagens de destaque em outras produções o que naturalmente pode confundir as apostas do público sobre quem seria o culpado ou culpada do assassinato.
Assim, com maestria o diretor compõe seu quadro de suspeitos. Temos Chris Evans na pele de Hugh, um dos netos de Harlan, playboy e mimado; Jamie Lee Curtis como Linda, a filha mais velha do finado e que nutria certa competição com Harlan; Michael Shannon interpretando Walter, o filho mais novo e responsável por tocar a editora de livros de mistério; Don Johnson, marido de Linda, um cara meio sem filtro; e Toni Collete como Joni, nora de Harlan que vive como influencer digital.
Infelizmente fica invisível a esse grupo a atriz cubana Ana de Armas, como a cuidadora de Harlan, Marta Cabreras; e Daniel Craig, que talvez esteja em seu melhor papel em anos. Craig é um detetive , que faz uma clara reverência aos detetives do gênero, há quem diga que esse papel possa levá-lo ao Oscar, principalmente por deixar aquele ar britânico de lado e mostrar sua outra faceta.
‘O que é interessante em tudo isso?‘ Essa é a pergunta primordial das tramas de mistério de assassinato e todas essas peças são colocadas no tabuleiro para que, então, possamos brincar de adivinhar. Mas como fazer para quebrar o protocolo, superar as sequências previsíveis e ainda divertir o público?
A obra responde com inúmeros anticlímax e, claro, reviravoltas, tudo com bom humor.
O diretor usa os próprios clichês do gênero para quebrar as expectativas e mudar completamente a perspectiva do filme. Você vai se ver muitas vezes mudando a própria opinião durante o filme: inicialmente, você vai ficar mais interessado em quem foi, para depois ficar mais curioso sobre como foi, tudo com uma grande parcela de cenas engraçadas.
Temos aqui uma comédia de mistério cheia de detalhes que enriquecem a experiência tudo o que aparece em cena, mesmo discretamente, foi estrategicamente posicionado para finalizar a trama. E isso, por si só, já é uma experiência e tanto. O elenco afinado e os jogos com plot twists criam uma “confusão proposital” que compõe o grande charme da obra.
“Entre Facas e Segredos” mantém o mistério e a diversão até a sequência final e prova ser realmente uma grande homenagem a Agatha Christie. Se você gosta de jogos de adivinhação, fica aí uma dica excelente para o final de semana.